segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Conto de bolso

E lá estava ela.
Com seus longos cachos negros caindo pelo ombro. Seus olhos - sempre atenciosos - fitavam tudo o que acontecia ao seu redor. Seus ouvidos (um pouco sujos, é verdade) eram capazes de escutar todos os barulhos daquele lugar onde mergulhara.
Palmas. Porta fechando. Passos altos (provavelmente de alguém com o dobro de sua altura). Risadas, muitas risadas. Tosse. Porta abrindo. Pessoas falando incansantemente. Passos leves. Alguém cantando (tinha uma voz que lhe doía os ouvidos). Tosse de novo.
E era só se desconcentrar um pouco no som ambiente, que eles voltavam. Os ruídos, as imagens. Tudo voltava. Mas ela preferia morrer a ter que relembrar tudo aquilo. Era maior que ela, a dor. Dava pra senti-la nos olhos, no sangue, nos ossos, na carne. E a cada lembrança, a dor alcançava lugares novos, lugares no corpo dela que até então eram desconhecidos.
Mas o que, naquele lugar, não era desconhecido para ela? Apenas as lembranças, as memórias. De uma vida que nunca poderia ter novamente. Mas ela a queria novamente? Não sabia, não sabia de mais nada. Quando a dor chegava, tudo que conseguia pensar era em não pensar.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

ESSÊNCIA(L)

Não faz sentido dividir as pessoas em boas e más. Pessoas são apenas encantadoras ou monótonas.
Não faz sentido dividir a vida em passado e futuro. A vida é apenas viver, é apenas presente (em quem?)
Certo dia, Bela estava "carpediezando" por aí. Não sei onde ela estava e ela não soube me dizer se fora real. Estávamos muito próximas naqueles tempos (bem, não sei se próximas é a palavra certa, afinal não sei o quão possível é estar próximo de mim) Mas o fato é que ela estava sedenta da minha presença dentro dela, ela queria me sentir lá no fundo de seus ossos, ela queria muito mais do que uma experiência comigo, ela queria me possuir.
Não sei o que ela fez comigo, mas eu também andava a procura dela. A um longo tempo, até. E quando quero tombar uma pessoa, sou incansável. Estou em todos os lugares, nos mínimos detalhes, a toda e qualquer hora. Fico como um viciado atrás de sua dose de heroína, só que sou mais intensa, mais anarquista, mais gelada. Sou mais vento e mais calor. Sou nostalgia. Sou sonho. Sou menos desmedida, sou pura adrenalina, consigo fazer você ser destemido e doce ou bravo e amargo (depende da dose em que entro em você). Eu já estava dentro dela, aquela altura, mas não tínhamos conseguido nos encontrar. E essa é, para mim e para ela, a pior parte. É como chegar perto mas não conseguir o orgasmo, é como querer morrer e estar vivo ou querer viver e estar morto. É a linha transitória entre o ser e o querer.
Mas outrora, naquele dia, eu já era um baseado. Entrei na cabeça dela e a tornei como nenhum outro sentimento pode tornar: livre!

Ass: Liberdade.