O mundo nunca foi economicamente tão desigual. Uma
uniformização se tornou obrigatória, hostil à diversidade cultural do planeta.
Os meios de comunicação da era eletrônica, a maioria a serviço da incomunicação
humana, estão impondo a adoração unânime dos valores da sociedade neoliberal.
Enquanto isso, nosso mundo se parece cada vez mais com um reino de mudos. Nesse
mundo sem alma que os meios de comunicação nos apresentam como único mundo
possível, os povos foram substituídos pelos mercados; os cidadãos, pelos
consumidores; as nações, pelas empresas; as cidades, pelas aglomerações; as
relações humanas, pelas concorrências comerciais. A televisão propõe um serviço
completo: não apenas funciona de maneira com que se confunda qualidade de vida
e quantidade de objetos, mas, além disso, oferece cotidianamente cursos
audiovisuais de violência, que os videogames completam. O crime é o espetáculo
mais valorizado da telinha. “Bata antes que batam em você”, aconselham os jogos
eletrônicos. “Você está só, e não pode contar com mais ninguém”, Carros alçam
vôo, pessoas explodem. “Você também pode matar.”
A pobreza ainda suscita pena, mas , cada vez menos, a
indignação; a ideia de que os pobres são o resultado do acaso ou do fruto da
fatalidade se propaga. Há 20 anos, a pobreza era vista como consequência da
injustiça. A esquerda dizia, os centristas admitiam, e a própria direita não
negava. Hoje em dia, a pobreza é “o justo castigo que merece a ineficiência”,
ou “uma manifestação da ordem natural das coisas”. A pobreza foi desconectada
da injustiça; e a própria noção de injustiça, há pouco tempo certeza universal,
atenuou-se aos pousos até desaparecer. O código moral atual não condena a
injustiça, mas o fracasso.
No hemisfério sul, onde vivem os perdedores, a violência é
raramente considerada resultado da injustiça. É frequentemente mostrada como
fruto da má conduta de seres de terceira categoria que moram no que chamam de
terceiro mundo, condenados à violência porque é da sua natureza.
Carros insuperáveis, sabões prodigiosos, perfumes
excitantes, analgésicos mágicos: através da telinha, o mercado hipinotiza o
cidadão-consumidor. Mas, às vezes, entre um anúncio e outro, a televisão mostra
algumas imagens de fome e de guerra. Esses horrores, essas fatalidades chegam
de um outro mundo, do inferno, e servem apenas para realçar o caráter
paradisíaco da sociedade de consumo.
Os mestres da informação, na era da informática, chamam de
comunicação o monólogo do poder. A ofensiva aviltante da incomunicação nos
obriga a medir a importância do desafio cultural. Mais do que nunca, é preciso
enfrenta-lo quando os meios de comunicação gostariam de nos convencer a
abandonar a esperança como se abandona um cavalo cansado.
Por Eduardo Galeano